Fazia dois anos que não conversávamos direito. Fazia dois anos que não nos sentávamos sozinhos na cozinha para encher a cara e fantasiar futuros possíveis.
Eram noites doídas, porque eu podia ver em seus olhos que o único futuro que ele vislumbrava estava sentado à sua frente, ajeitando a franja a cada dois minutos e piscando os olhos devagar, falando de uma casa na praia, um filho quem sabe e um grande amor que eu vivia para buscar, mas nunca encontrava.
Ele mentia que seria feliz com uma casa rústica no interior da Irlanda, algumas crianças e uma mulher que cozinhasse curry todas as noites. Doía, mas era quase terapêutico – um lembrete muito bem vindo de que nunca nos apaixonamos por quem gostaríamos de nos apaixonar.
De todos os homens que eu gostaria muito de ter amado, foi para ele que mais desejei ter dito “Eu te amo”. Ensaiei milhões de vezes em pensamento, mas soava sempre duplamente falso. Primeiro porque não era exatamente verdade – não como ele gostaria –, e segundo porque tinha que ser dito em outra língua, e I Love you é cinematográfico demais para ser crível.
Agora, dois anos mais tarde, num desses dias tão bonitos que acabam espalhando melancolia por todos os lados, acordei de um cochilo com a nítida certeza – quase uma urgência – de que precisava dizer que o amava. Não um amor de largar tudo; eu estava feliz e, pelo que sabia, ele também. Mas era dessas fúrias que começam no estômago, sobem pelo pescoço e começam a latejar em todas as partes do corpo se não se faz nada a respeito.
Ponderei por exatos dez segundos. E se ele entendesse tudo errado? Se largasse e namorada e viesse atrás de mim? Foda-se, pensei. Os outros que lidem com as minhas verdades. Abri o gmail e escrevi, com dois anos de atraso e toda a sinceridade que esses pequenos arroubos de lucidez absoluta me proporcionam.
I’ll say it in Portuguese, so it doesn’t sound fake:
Eu te amo, Neil.
Love, Alice.
5 agosto, 2011 at 9:02 pm
Rapaz. Deu-me uma coragem.
5 agosto, 2011 at 9:13 pm
Então lê o próximo texto, que eu acabei de postar 😉
6 setembro, 2011 at 10:42 pm
Deu, deu coragem. E deu medo, também, porque não há um sem o outro. Certo?